De OUTRASMÍDIAS, 19 de Agosto 2022
Por Gabriel dos Santos Rocha, no Geledés
Por Gabriel dos Santos Rocha, no Geledés
As ciências humanas brasileiras nos fornecem uma gama de intérpretes do Brasil, de diferentes épocas e de distintas tendências teóricas e políticas. Trata-se de autores e autoras vinculados aos variados campos do conhecimento, que dedicaram suas obras ao desvendamento e à análise aprofundada dos fundamentos de nossa formação histórica, social, econômica, cultural e política.
O passado colonial, o sistema escravista, a inserção do país no capitalismo global, a formação do Estado-Nação, o mercado de trabalho, o desenvolvimento do capitalismo, as classes e as desigualdades sociais, as religiões, as culturas e formas de sociabilidade. Todos esses são temas pautados na produção dos intelectuais que assumiram a tarefa de interpretar o Brasil.
Para alguns desses intelectuais não basta a interpretação, é necessário, também, a transformação da sociedade. Dentre esses situa-se Clóvis Moura (1925-2003): historiador, sociólogo, jornalista e poeta. Um pensador comprometido com a emancipação da classe trabalhadora e com a luta antirracista, sem as quais, para ele, não haverá emancipação humana. Um intelectual negro, marxista e militante comunista.
Portanto, para além de um intérprete do Brasil, Clóvis Moura foi um intelectual orgânico: não dissociou o exercício teórico da atividade política. Participou dos debates e das lutas sociais de seu tempo. A Sociologia e a História destacam-se no seu campo de produção, embora sua obra também dialogue, em alguma medida, com a Antropologia e a Economia.
A relação entre raça e classe no passado e no presente brasileiro esteve no centro da análise de Moura sobre o processo histórico brasileiro, servindo-lhe de chave interpretativa do Brasil e sendo, também, um dos fundamentos de sua práxis política.
A luta de classes no escravismo
Clóvis Moura tem contribuições importantes para a historiografia, a sociologia e para o pensamento marxista. Seu livro de estreia nas ciências humanas, Rebeliões da Senzala (1959), traz uma abordagem original do escravismo e da luta de classes no Brasil. Nele, o autor interpreta o processo histórico a partir da contradição entre escravizado e escravocrata, as duas classes fundamentais da sociedade escravista. Tal contradição, para Moura, foi o elemento dinamizador da sociedade colonial e imperial. Se para o marxismo a luta de classes é o motor da história, no Brasil essa luta tem origem nas insurreições negras contra o escravismo e na resistência dos povos originários.
Moura interpretou a formação social do Brasil colonial e imperial vinculada ao modo de produção escravista sem perder de vista a agência do negro como sujeito histórico. Assim, o autor foi pioneiro em analisar sistematicamente os quilombos e as rebeliões negras, conferindo sentido político ao protesto dos escravizados e, ao mesmo tempo, nos fornecia as bases para a construção de um conhecimento histórico a partir dos subalternizados: uma história vista de baixo.
Os quilombolas, escravizados e libertos, indígenas, trabalhadores livres constituíram as forças de negação da ordem escravista. Situados no pólo expropriado e oprimido, foram os sujeitos históricos da luta de classes daquele período. Para Clóvis Moura, as insurreições negras não foram fatos esporádicos e isolados, ao contrário, ocorreram sistematicamente durante a escravidão. Tais revoltas foram amplamente abordadas em suas obras. Além de Rebeliões da Senzala (1959), destacamos: Os quilombos e a rebelião negra (1981), Quilombos: resistência ao escravismo (1987) e História do negro brasileiro (1989).
O passado colonial, o sistema escravista, a inserção do país no capitalismo global, a formação do Estado-Nação, o mercado de trabalho, o desenvolvimento do capitalismo, as classes e as desigualdades sociais, as religiões, as culturas e formas de sociabilidade. Todos esses são temas pautados na produção dos intelectuais que assumiram a tarefa de interpretar o Brasil.
Para alguns desses intelectuais não basta a interpretação, é necessário, também, a transformação da sociedade. Dentre esses situa-se Clóvis Moura (1925-2003): historiador, sociólogo, jornalista e poeta. Um pensador comprometido com a emancipação da classe trabalhadora e com a luta antirracista, sem as quais, para ele, não haverá emancipação humana. Um intelectual negro, marxista e militante comunista.
Portanto, para além de um intérprete do Brasil, Clóvis Moura foi um intelectual orgânico: não dissociou o exercício teórico da atividade política. Participou dos debates e das lutas sociais de seu tempo. A Sociologia e a História destacam-se no seu campo de produção, embora sua obra também dialogue, em alguma medida, com a Antropologia e a Economia.
A relação entre raça e classe no passado e no presente brasileiro esteve no centro da análise de Moura sobre o processo histórico brasileiro, servindo-lhe de chave interpretativa do Brasil e sendo, também, um dos fundamentos de sua práxis política.
A luta de classes no escravismo
Clóvis Moura tem contribuições importantes para a historiografia, a sociologia e para o pensamento marxista. Seu livro de estreia nas ciências humanas, Rebeliões da Senzala (1959), traz uma abordagem original do escravismo e da luta de classes no Brasil. Nele, o autor interpreta o processo histórico a partir da contradição entre escravizado e escravocrata, as duas classes fundamentais da sociedade escravista. Tal contradição, para Moura, foi o elemento dinamizador da sociedade colonial e imperial. Se para o marxismo a luta de classes é o motor da história, no Brasil essa luta tem origem nas insurreições negras contra o escravismo e na resistência dos povos originários.
Moura interpretou a formação social do Brasil colonial e imperial vinculada ao modo de produção escravista sem perder de vista a agência do negro como sujeito histórico. Assim, o autor foi pioneiro em analisar sistematicamente os quilombos e as rebeliões negras, conferindo sentido político ao protesto dos escravizados e, ao mesmo tempo, nos fornecia as bases para a construção de um conhecimento histórico a partir dos subalternizados: uma história vista de baixo.
Os quilombolas, escravizados e libertos, indígenas, trabalhadores livres constituíram as forças de negação da ordem escravista. Situados no pólo expropriado e oprimido, foram os sujeitos históricos da luta de classes daquele período. Para Clóvis Moura, as insurreições negras não foram fatos esporádicos e isolados, ao contrário, ocorreram sistematicamente durante a escravidão. Tais revoltas foram amplamente abordadas em suas obras. Além de Rebeliões da Senzala (1959), destacamos: Os quilombos e a rebelião negra (1981), Quilombos: resistência ao escravismo (1987) e História do negro brasileiro (1989).
Raça e classe na formação do Brasil
Clóvis Moura também analisou o papel do racismo na formação e na dinâmica da sociedade de classes no Brasil. Como já mencionamos, a relação entre raça e classe no processo histórico brasileiro, a saber, na formação social, cultural, política e econômica do país esteve no centro das reflexões do autor. O sistema colonial e a economia escravista são processos históricos de longa duração com desdobramentos no tempo presente.
O latifúndio, a monocultura de produtos primários voltada ao abastecimento do mercado internacional e a superexploração da força de trabalho da população negra são fatores histórico-estruturais que atravessam diferentes temporalidades. Tais fatores são fundamentais para compreendermos a localização periférica e o caráter dependente do capitalismo brasileiro, assim como a disseminação e a funcionalidade do racismo em todas as esferas da vida social.
A exploração da força de trabalho das populações negras e indígenas foi e segue sendo um fator decisivo de produção e acumulação de riquezas para as classes dominantes brasileiras e de outras nações capitalistas. A divisão social do trabalho segue racializada em nível nacional e internacional, mantendo majoritariamente os “não-brancos” nos estratos mais explorados e socialmente vulneráveis.
Neste ponto, o Brasil é um caso emblemático: o país tem 56,2% de pretos e pardos (negros) em sua população. Porém, no mercado de trabalho, esse mesmo segmento da população situa-se em 64,2% de força de trabalho “desocupada” (desempregada), e 66,1% “subutilizada” (na intermitência). As desigualdades entre negros e brancos também se revelam na distribuição de renda e moradia, nos níveis de educação formal, na taxa de homicídios e na representação política.
A função do racismo no sistema capitalista e a situação do negro na sociedade de classes brasileira foram estudados por Moura em livros como O Negro: de bom escravo a mau cidadão? (1977), Brasil: raízes do protesto negro (1983), Sociologia do negro brasileiro (1988) e Dialética radical do Brasil negro (1994).
A revolução brasileira
A produção intelectual de Clóvis Moura não se dissocia de sua atividade política, para ele o sentido de compreender os movimentos da realidade consiste em poder nela intervir. Assim, o autor tomou partido na luta pela emancipação do ser humano da exploração capitalista e entendeu o racismo como ferramenta ideológica de dominação e expropriação dos negros – maioria da população brasileira.
Clóvis Moura deixou um importante legado para a História, a Sociologia e para as lutas sociais de nosso tempo. Sua obra nos ensina que um projeto de transformação social radical – uma revolução brasileira – impreterivelmente deve considerar o processo histórico que produziu nossa sociedade, e deve, também, amparar-se na realidade concreta de nosso tempo presente.
Combater o racismo é uma tarefa drástica, na medida em que ele nos remete às raízes que se tornaram troncos – ou estruturas – de nossa sociedade. Moura nos mostra como o racismo está entranhado na contradição trabalho/capital. Portanto, a emancipação humana com a superação de tal contradição, necessariamente passa pela luta antirracista.
GELEDÉS
GELEDÉS Instituto da Mulher Negra fundada em 30 de abril de 1988. É uma organização da sociedade civil que se posiciona em defesa de mulheres e negros por entender que esses dois segmentos sociais padecem de desvantagens e discriminações no acesso às oportunidades sociais em função do racismo e do sexismo vigentes na sociedade brasileira. Posiciona-se também contra todas as demais formas de discriminação que limitam a realização da plena cidadania, tais como: a lesbofobia, a homofobia, os preconceitos regionais, de credo, opinião e de classe social.
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