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Omissão do Estado silencia diante da violência instalada na Amazônia

Do IHU, 27 Julho 2022
Por  Edelberto Behs, jornalista.



Nenhum projeto, seja ele conservador ou progressista, liberal ou desenvolvimentista, conseguirá transformar a região Amazônica sem que, antes, “o crime e a violência seja vigorosamente enfrentados”.

O vaticínio é da diretora executiva do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Samira Bueno, doutora em Administração Pública e Governo, e do diretor-presidente da entidade, Renato Sérgio Lima, doutor em Sociologia pela USP, em artigo para o Anuário de Segurança Pública 2022.

Essa violência, argumentam, “é uma realidade que sequestra a liberdade da população e a torna refém de mercadores do caos”. O medo, arrolam, “é um importante cabo eleitoral de grupos que exploram a boa-fé da população e dependem das ilegalidades para movimentar a economia do crime”.

Compõem esse quadro o desmatamento, o garimpo ilegal, a corrupção, a criminalidade, a presença de milícias e facções do crime organizado, entre elas o Primeiro Comando da Capital e o Comando Vermelho que disputam rotas nacionais e transnacionais de narcotráfico. A Amazônia brasileira transformou-se “em palco de guerra que impacta fortemente os índices de violência letal em toda a região e do país”.

O Anuário mostra que das 30 cidades brasileiras com taxas de mortes violentas intencionais superiores a 100 casos para cada grupo de 100 mil habitantes, dez delas estão localizadas na Amazônia, 11 em cidades rurais. A Amazônia foi responsável por 77% das mortes por conflitos no campo nos últimos dez anos, mostram dados da Comissão Pastoral da Terra.

Samira Bueno e Renato de Lima responsabilizam o crime e a omissão do Estado para o surgimento desse “ecossistema de violência, impunidade e ilegalidades”. As estruturas policiais e militares existentes são incapazes de atuar no combate ao crime quando adequadamente mobilizadas.

No Acre, mostra o Anuário, estavam ativos, em março deste ano, 78 delegados de polícia para atender todo o Estado. Em Roraima esse número cai para 56 delegados. “No mundo, se não existe investigação, não existe justiça. E se não existe justiça, a sensação de impunidade se agrava e vira um salve-se quem puder e/ou quem tiver mais poder bélico”, afirmam os representantes do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

A dupla atribui o contexto de violência hoje verificado na região ao processo de integração nacional iniciado nos anos 60, “que possibilitou a mobilidade do capital e do trabalho para a região”. O modelo de desenvolvimento para a Amazônia, conhecido como modelo de economia de fronteiras, “enxerga os recursos naturais como uma fonte inesgotável e por isso os agentes hegemônicos do capitalismo promovem um tipo de acumulação por espoliação que transforma povos indígenas, quilombolas, ribeirinhos e camponeses em sujeitos subalternizados”, apontam.

As mortes do indigenista Bruno Pereira e do jornalista inglês Dom Phillips, em junho passado, ocorridas no Vale do Javari, no Amazonas, escancararam a violência instalada na região.

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