Em depoimento de cinco horas no Senado, ministro inventa dados sobre vacinas, omite-se sobre negligência do governo e desaponta até governistas. Oposição já tem assinaturas para inquérito. Pacheco conseguirá socorrer Bolsonaro?
Do OUTRA SAÚDE, 12/02/2021
por Raquel Torres
SÓ ENROLAÇÃO
Comentamos na última edição que os senadores iam decidir, a partir de uma audiência com o ministro da Saúde Eduardo Pazuello, se abrem ou não uma CPI para investigar a atuação do governo federal durante a pandemia. A reunião aconteceu ontem, estendendo-se por cinco horas. O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), disse depois que ia conversar com os líderes da Casa para avaliar se as respostas foram “suficientes”. Segundo a Coluna do Estadão, até governistas ficaram supresos (negativamente) com a performance do ministro. A oposição já tem assinaturas suficientes para o início da comissão parlamentar, e cabe a Pacheco dar o sinal verde. Sabe-se lá o que vai ser decidido, mas definitivamente não dá para dizer que a audiência tenha sido muito informativa.
Sob pressão, o general disparou informações que simplesmente não têm lastro no mundo real. Disse, por exemplo, que toda a população brasileira “vacinável” (isto é, maior de 18 anos) vai ser imunizada ainda este ano, e metade desse total até junho. Pode ser que milagres aconteçam, mas o próprio o Plano Nacional de Imunização estima, sem mencionar datas específicas, que isso só vá acontecer até 12 meses depois que os grupos prioritários estiverem cobertos. E, para o primeiro trimestre, o Brasil só conta com doses suficientes para vacinar 25% desses grupos… Até agora, as vacinas chegaram a 2,7% da população adulta. E só a primeira dose. Com estoques no fim, pelo menos sete capitais devem interromper as campanhas ou limitar ainda mais o público-alvo na próxima semana.
O problema, segundo Pazuello, é que está difícil conseguir comprar vacinas de fora e as empresas agora oferecem poucas doses. Exatamente: ao longo dos últimos meses vimos o governo federal cruzar os braços enquanto vários países estabeleciam tantos contratos quantos fossem capazes. O general mencionou pequenas compras anunciadas, como as 10 milhões de doses da Sputnik V e outras 20 milhões da Covaxin (sendo que este imunizante ainda nem tem resultados de ensaios de fase 3), e voltou a desdenhar da Pfizer, porque em sua opinião o Brasil “não precisa se submeter” às cláusulas contratuais da farmacêutica – ao contrário dos EUA, do Reino Unido e dos países da União Europeia, que as aceitaram de bom grado.
A verdadeira aposta brasileira, disse Pazuello, está na produção nacional, a partir do Instituto Butantan e da Fiocruz. É… Só que essa produção depende de insumos de fora, e, como temos visto, o fornecimento anda muito menos veloz que o desejado. Mesmo assim, para o ministro, está tudo azul: o Brasil está “abrindo o leque para ter reservas” de vacina e exportar para outros países da América Latina (uma possibilidade que já foi mesmo levantada pelo Instituto Butantan – porque o Ministério da Saúde não decidia se ia ou não querer mais doses da CoronaVac para o SUS).
Pazuello ainda ofereceu um estapafúrdio argumento contra a abertura da CPI. Usando uma comparação com a Alemanha de Hitler, ele disse basicamente que investigar os erros do governo na pandemia pode gerar mais mortes: “A Alemanha perdeu a guerra duas vezes porque ela abriu a frente russa. Não há como manter duas frentes. Nós temos uma guerra, é contra a covid. Se nós entrarmos numa nova frente nessa guerra, que é a frente política, vai ser mais difícil ganhar a guerra. E o resultado disso, é óbvio, é perder mais gente”.
QUAL É A FONTE?
Tem mais. Durante a audiência, Pazuello disse que a variante do coronavírus identificada em Manaus é “três vezes mais contagiosa”, mas “graças a Deus tivemos a notícia clara de que as vacinas têm validade com essa variante ainda”. São duas informações que nunca haviam sido divulgadas em lugar nenhum, mas foram jogadas assim, sem qualquer explicação adicional.
Como foi feita a análise sobre a transmissibilidade (se é que foi feita)? Que vacinas foram testadas contra a nova variante, quando foi isso, que resultados foram colhidos (se é que isso aconteceu)? O ministro não deu detalhes, e nos parece altamente improvável eles existam. O irônico é que que se a pasta realmente descobriu que a P.1 é 200% mais contagiosa e não fez nada a respeito, isso é nada menos que um atestado de omissão. O Reino Unido viu que sua variante é cerca de 40% mais transmissível e tem sido uma grande correria para impedir o espalhamento. O território inteiro está em lockdown, mesmo que um quinto da população já tenha tomado a primeira dose de alguma das vacinas.
A propósito, o Brasil registrou ontem 1,4 mil novas mortes por covid-19, que é o maior balanço diário desde julho. Em transmissão ao vivo, Jair Bolsonaro disse que não adianta ficar em casa chorando, pois a economia não pode parar.
CLOROQUINA, FIOCRUZ, MINISTÉRIO
Uma reportagem da Folha sobre a fabricação de hidroxicloroquina na Fiocruz gerou várias críticas e uma nota de esclarecimento por parte da instituição. O jornal afirmou ter obtido documentos mostrando que o Ministério da Saúde usou a Fiocruz para produzir quatro milhões de comprimidos dessa droga, além de Tamiflu, para pacientes com covid-19. Para completar, isso teria sido feito com recursos públicos emergenciais voltados a ações contra a doença: um dos papéis, de junho, informa textualmente que o crédito extraordinário liberado pela MP nº 940 fora usado para esse fim.
A Fundação diz que produziu hidroxicloroquina como faz há duas décadas, a partir de solicitações do Ministério para o Programa Nacional de Prevenção e Controle da Malária; as últimas remessas à pasta foram feitas em março de 2020 e janeiro de 2021, ambas para atendimento ao programa. Segundo a nota, os recursos emergenciais não foram usados nisso, mas sim para financiar ações como ampliação da capacidade de testagem, ensaios clínicos de novas drogas e a construção de um centro hospitalar voltado para covid-19. Parte da verba foi usada para a produção do Tamifu, mas visando ao tratamento da influenza.
O Ministério também publicou nota dizendo que não usou os recursos emergenciais alocados à Fiocruz para comprar cloroquina, e que a aquisição realizada em 2020 tinha sido programada ainda em 2019, portanto antes da pandemia.
Só que outra matéria, também na Folha, mostra um ofício da pasta justificando, no dia 4 de fevereiro, uma mudança de rumo em relação às drogas que seriam usadas contra a malária. “A aquisição desse medicamento foi planejada e instruída para atendimento ao programa de malária. Entretanto, com o advento da pandemia pelo novo coronavírus e dadas as orientações de uso pelo Ministério da Saúde, este medicamento passou a ser disponibilizado no SUS, em 27/03/2020, também para uso no contexto Covid-19″, diz a pasta, respondendo a questionamentos da Procuradoria do Distrito Federal, que investiga improbidade administrativa por parte do general Eduardo Pazuello. O documento detalha: “As distribuições foram realizadas aos estados, Distrito Federal e municípios conforme o número de casos de Covid-19 registrados no boletim do Ministério da Saúde e também com base nas solicitações enviadas pelas secretarias estaduais e municipais de Saúde”.
Ou seja: os ofícios do Ministério se contradizem. Ao que parece, a pasta pode não ter usado verbas da pandemia para pedir à Fiocruz que produzisse cloroquina contra covid-19 – talvez tenha “apenas” desviado esses remédios que são eficazes contra a malária, precisavam ser usados por pacientes com tal doença e foram fabricados com essa finalidade.
Deputados do PT, PSB e PSOL protocolaram ontem uma representação na PGR para que o caso seja investigado.
LEVA TEMPO
A AstraZeneca informou ontem que vai adaptar sua vacina para as novas variantes do coronavírus, mas que isso deve levar de seis a nove meses. Enquanto isso, a farmacêutica prometeu dobrar a produção atual, para chegar a 200 milhões de doses mensais até abril. O diretor-executivo da empresa, Pascal Soriot, disse que a vacina “não é perfeita, mas é ótima” e vai salvar vidas.
Milhões de doses desse imunizante vão começar a ser distribuídos a profissionais de saúde em vários países africanos nos próximos dias. Mas os Centros de Controle de Doenças da África não seguiram totalmente a posição da OMS e decidiram não recomendar seu uso em países onde a variante B-1351, identificada pela primeira vez na África do Sul, já seja dominante. “Nossa recomendação para o uso da vacina AstraZeneca é muito clara. Se você tiver evidências de que a variante é predominante em seu país, recomendamos que a vacina não seja aplicada pelo motivo óbvio de que terá atividade reduzida em anticorpos neutralizantes ”, disse John Nkengasong, diretor do órgão, ao Health Policy Watch.
OUTRA OPÇÃO, MAS RESTRITA
O anti-inflamatório tocilizumabe, usado para tratar artrite reumatoide, consegue reduzir a taxa de moralidade de pessoas hospitalizadas por covid-19, diminuir a necessidade de ventilação mecânica e baixar o tempo de permanência no hospital. A conclusão é do maior ensaio clínico randômico que avalia tratamentos para a doença no mundo: o Recovery, conduzido no Reino Unido, que no ano passado atestou a eficácia da dexametasona para reduzir as mortes em casos graves e a inutilidade da hidroxicloroquina. Vários outros trabalhos já tinham analisado a droga, mas com resultados inconclusivos. Os dados do Recovery foram divulgados ontem (aqui), ainda sem revisão por pares.
No teste em questão, feito com cerca de quatro mil pacientes, metade recebeu tocilizumabe e metade recebeu apenas o tratamento-padrão. No fim, 29% dos que usaram a droga morreram, contra 33% dos demais. É preciso tratar 25 pessoas para salvar uma vida, o que, não soa tão bom assim. Ainda mais comparando com o efeito da dexametasona, muito mais impressionante: ela diminui em um terço as mortes dos pacientes submetidos a ventilação mecânica, e em um quinto para quem está apenas recebendo oxigênio.
Mas aí é que está. A potência do tocilizumabe, dizem os pesquisadores, reside em usá-lo junto com a dexametasona ou outro corticoide sistêmico. De acordo com eles, os dados indicam que a combinação das duas drogas reduz a mortalidade em quase 50% para pacientes que requerem ventilação mecânica invasiva, além de um terço para os que estão no suporte de oxigênio. Nesse caso, as chances dos pacientes realmente aumentam bastante.
O problema é que, enquanto a os corticoides são remédios bem baratos, o mesmo não se pode dizer do tocilizumabe: no Reino Unido, ele chega a custar 100 vezes mais que a dexametasona. “Esta será mais uma ferramenta para os países ricos, mas não é algo que estará amplamente disponível para o resto do mundo”, diz Ashish Jha, reitor da Escola de Saúde Pública da Brown University, no site da Science.
DE NOVO
Duas pessoas morreram com ebola na República Democrática do Congo, apenas três meses depois do fim do 11º surto da doença no país. O trabalho de rastreamento já identificou cerca de 200 pessoas que tiveram contato com as vítimas, e a OMS deve começar uma campanha de vacinação nos próximos dias.
Grupo de Pesquisa Sul-Sur
Este grupo se insere numa das linhas de pesquisa do LABMUNDO-BA/NPGA/EA/UFBA, Laboratório de Análise Política Mundial, Bahia, do Núcleo de Pós-graduação da Escola de Administração da UFBA. O grupo é formado por pesquisadores de diferentes áreas do conhecimento e de diferentes instituições públicas de ensino e pesquisa.
Buscamos nos apropriar do conhecimento das inter-relações das dinâmicas socioespaciais (políticas, econômicas, culturais) dos países da América do Sul, especialmente do Brasil, da Bolívia, da Argentina e do Chile, privilegiando a análise histórica, que nos permite captar as especificidades do chamado “subdesenvolvimento”, expressas, claramente, na organização das economias dos diversos povos, nos grupos sociais, no espaço.
Nosso campo de investigação dialoga com os campos da Geopolítica, Geografia Crítica, da Economia Política e da Ecologia Política. Pretendemos compreender as novas cartografias que vêm se desenhando na América do Sul nos dois circuitos da economia postulados por Milton Santos, o circuito inferior e o circuito superior. Construiremos, desse modo, algumas cartografias de ação, inspirados na proposta da socióloga Ana Clara Torres Ribeiro, especialmente dos diversos movimentos sociopolíticos dessa região, das últimas décadas do século XX à contemporaneidade.
Interessa-nos, sobretudo, a compreensão e a visibilidade das diferentes reações e movimentos dos países do Sul à dinâmica hegemônica global, os espaços de cooperação e integração criados, as potencialidades de criação de novos espaços e os seus significados para o fortalecimento da integração e da cooperação entre os países do Sul, do ponto de vista de outros paradigmas de civilização, a partir de uma epistemologia do sul. Através das cartografias de ação, buscamos perceber as antigas e novas formas de organização social e política, bem como os espaços de cooperação SUL-SUL aí gestados. Consideramos a integração e a cooperação Sul-Sul como espaços potenciais da construção de novos caminhos de civilização que superem a violência do desenvolvimento da forma em que ele é postulado e praticado.

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