As teorias de Lênin, Rosa Luxemburgo e Kautsky. Os métodos para ampliar mercados e pilhar países periféricos. As oligarquias locais coniventes. A busca por um sistema híbrido: capitalista, feudal e escravocrata. Sua nova fase de “guerra permamente”
Do OUTRAS PALAVRAS, 10/12/2020
por Luis Eustáquio Soares1.
O que é o imperialismo? Em diálogo com Rosa Luxemburgo, de Acumulação do capital, livro de 1913, o imperialismo é o vetor bélico-burocrático que superexplora e violenta os povos, principalmente da África, Ásia, América Latina, transformando, assim, a acumulação primitiva do capital em um vetor transversal do modo de produção capitalista, tendo em vista: a) a ampliação do mercado capitalista para regiões periféricas; b) sem deixar de se apropriar das matérias-primas importantes para o controle militar-monopólico do mercado ampliado; c) objetivando sempre a reprodução ampliada do capital, impossível de ser efetivada apenas por relações capitalistas de produção.
2.
Para Karl Kautsky, em ensaio de 1914, intitulado Ultraimperialismo, o imperialismo é captura e ao mesmo a manipulação que os detentores do capital monopólico dos centros do sistema mundial capitalista fazem da renda diferencial da terra, ao associar-se com as oligarquias latifundiárias, com o propósito de violentar e de superexplorar os povos excluídos do direito sagrado à terra. Argumentou também que a tendência do imperialismo seria a de se transformar em ultraimperialismo, definindo este como um consórcio de países imperialistas que deixaria de guerrear entre eles depois que a partilha do mundo estivesse realizada.
3.
Em Imperialismo: etapa final do capitalismo, obra de 1916, Lênin o definiu, o imperialismo, como: a) forças extraeconômicas; b) associadas ao capital monopólico; c) misto de capital financeiro e industrial; d) que, armadas até os dentes, impõem e ao mesmo tempo disputam, mundialmente, o saqueio dos povos; d) forçando uma restrita hierarquização do desenvolvimento desigual e combinado; e) entre diferentes regiões do planeta; f) separando-as em centro e periferia; g) razão pela qual a etapa final do capitalismo, que é o imperialismo, é, também, o período de guerras permanentes.
4.
Atualizando esses três imensos teóricos do imperialismo, com Rosa Luxemburgo, de 1913, objetiva-se que a acumulação primitiva, com o sangue dos povos, é a cara escarrada do capitalismo imperialista. Com Kautsky de 1914, o que se evidencia é que o imperialismo tem como eterno aliado, para vampirizar os povos, o que há de pior na história destes últimos: latifundiários, capatazes, capitães do mato, fanáticos, sectários, lúmpens. Com Lênin, de 1916, por sua vez, o que se precisa é: o imperialismo é etapa final do capitalismo. Com isso o líder da Revolução de Outubro incorporou, para além das diferenças, ao mesmo tempo a perspectiva de Rosa Luxemburgo e de Kautsky, a fim de nos mostrar que essa etapa final significa sem meias palavras o inferno integral dos povos.
5.
Um traço comum em Rosa Luxemburgo, Kautsky e Lênin é: o imperialismo exporta capitais e guerras para as periferias do sistema, o que significa o retorno, no interior do modo de produção capitalista, do vetor precedente, o colonial.
6.
Outro traço comum é: o imperialismo é uma particularidade que o capitalismo assumiu, com a emergência do Estado e capital monopólicos. Essa particularidade, no entanto, assume a seguinte configuração: os Estados imperialistas deixaram de ser, com a emergência do capital monopólico, Estados burgueses e se tornaram propriamente Estados imperialistas que disputam e ao mesmo tempo impõem relações desiguais capitalistas de produção aos povos do mundo, com o objetivo de se apropriar do excedente da reprodução ampliada do capital.
7.
Assim, pois, como no capitalismo as relações sociais de produção são relações capitalistas de produção, no imperialismo emerge o que é possível chamar de relações imperialistas desiguais e interestatais de produção, que são um amálgama do colonialismo e do capitalismo, além do retorno híbrido de relações ao mesmo tempo capitalistas, feudais e escravistas de produção.
8.
No plano da concorrência pela superexploração dos povos, surgem as relações interimperialistas, responsáveis objetivamente pela primeira e a segunda guerras mundiais. Após, no entanto, a segunda guerra mundial, as relações interimperialistas de concorrência pelo saqueio dos povos, transformaram-se em relações ultraimperialistas de produção, sob o domínio do Estado monopólico de EUA.
9.
Diferentemente do que pensava Kautsky, a emergência do ultraimperialismo estadunidense não significou o começo de uma era de paz consensuada entre as potências imperialistas. Pelo contrário, a propósito, no livro Pentagonismo: substituto do imperialismo, escrito em 1967, seu autor, o ex-presidente da República Dominicana, Juan Bosch (ele mesmo golpeado por EUA), definiu o Petangonismo como uma nova fase do imperialismo, marcada por guerras permanentes, tendo como epicentro o complexo militar/industrial/financeiro/cultural estadunidense.
10.
O que Juan Bosch chamou, pois, de Pentagonismo, chamo de ultraimperialismo estadunidense, definido como ao mesmo tempo um metacolonialismo, porque retoma as formas coloniais de domínio dos povos; um metacapitalismo porque produz um capitalismo à sua imagem e semelhança, monopolizando a cadeia de valor em escala planetária; um metaimperialismo porque submete as potências imperialistas precedentes, sobretudo Alemanha, Inglaterra, França e Japão, ao mesmo tempo em que atualiza sem cessar as táticas e estratégicas usadas pelos países imperialistas precedentes, monopolizando-as a seu favor.
11.
O ultraimperialismo estadunidense é, pois, a fase final do imperialismo.
PS. No próximo texto, com o mesmo título, descreverei o ultraimperialismo estadunidense, começando a partir do aforismo décimo primeiro deste ensaio.
Referência:
BOSCH, JUAN. El Pentagonismo: sustituto del imperialismo, Editorial de Ciencias Sociales, La Habana, 2007.
KAUTSKY, Karl. “ultraimperialismo”. In: Arquivo Marxista na Internet. 1914. Disponível em: https:// www.marxists.org/portugues/kautsky/1914/09/11-1.htm Acesso em: 8 de novembro de 2017.
LÊNIN, Wladimir. Imperialismo: fase superior do capitalismo. Trad. Olinto Bercherman. 4. Ed. São Paulo: Global, 1987.
LUIS EUSTÁQUIO SOARES
É poeta, escritor, ensaísta e Professor da Universidade Federal do Espírito Santo; autor, dentre outros de "A sociedade do controle integrado: Franz Kafka e Guimarães Rosa", "O ultraimperialismo americano e a antropofagia matriarcal da literatura brasileira", "Sete ensaios sobre os imperialismos, em coautoria com Luis Carlos Muñoz", "O evangelho segundo satanás" (romance). Coordena o Projeto de Extensão Teatro dos Desoprimidos.
Grupo de Pesquisa Sul-Sur
Este grupo se insere numa das linhas de pesquisa do LABMUNDO-BA/NPGA/EA/UFBA, Laboratório de Análise Política Mundial, Bahia, do Núcleo de Pós-graduação da Escola de Administração da UFBA. O grupo é formado por pesquisadores de diferentes áreas do conhecimento e de diferentes instituições públicas de ensino e pesquisa.
Buscamos nos apropriar do conhecimento das inter-relações das dinâmicas socioespaciais (políticas, econômicas, culturais) dos países da América do Sul, especialmente do Brasil, da Bolívia, da Argentina e do Chile, privilegiando a análise histórica, que nos permite captar as especificidades do chamado “subdesenvolvimento”, expressas, claramente, na organização das economias dos diversos povos, nos grupos sociais, no espaço.
Nosso campo de investigação dialoga com os campos da Geopolítica, Geografia Crítica, da Economia Política e da Ecologia Política. Pretendemos compreender as novas cartografias que vêm se desenhando na América do Sul nos dois circuitos da economia postulados por Milton Santos, o circuito inferior e o circuito superior. Construiremos, desse modo, algumas cartografias de ação, inspirados na proposta da socióloga Ana Clara Torres Ribeiro, especialmente dos diversos movimentos sociopolíticos dessa região, das últimas décadas do século XX à contemporaneidade.
Interessa-nos, sobretudo, a compreensão e a visibilidade das diferentes reações e movimentos dos países do Sul à dinâmica hegemônica global, os espaços de cooperação e integração criados, as potencialidades de criação de novos espaços e os seus significados para o fortalecimento da integração e da cooperação entre os países do Sul, do ponto de vista de outros paradigmas de civilização, a partir de uma epistemologia do sul. Através das cartografias de ação, buscamos perceber as antigas e novas formas de organização social e política, bem como os espaços de cooperação SUL-SUL aí gestados. Consideramos a integração e a cooperação Sul-Sul como espaços potenciais da construção de novos caminhos de civilização que superem a violência do desenvolvimento da forma em que ele é postulado e praticado.

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