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Outra Saúde: O Brasil rumo ao obscurantismo climático

Seca em Manaus, em 2015: em menos de um mês, o Rio Negro baixou 7,28m
Desistência de sediar a COP-25 expõe Bolsonaro como imitador previsível de Trump e amplia preocupações com Amazônia. E mais: Osmar Terra, o ministro da “Cidadania”; saída dos médicos cubanos já provoca crises.
De Outras Palavras, 29 de novembro de 2018 

por Redação

Por Maíra Mathias e Raquel Gurgel, editoras do Outra Saúde


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O Brasil retirou sua candidatura da lista de países que desejavam sediar a próxima Conferência do Clima, a COP-25, que acontece no ano que vem. A decisão provocou mal-estar diplomático, segundo o Estadão. Isso porque estava tudo planejado para que a ONU chancelasse a escolha do país. A justificativa do governo foi o orçamento. Mas ninguém acredita que este seja o motivo real da decisão. Qual seria, então? Não é preciso nem contar até três: Jair Bolsonaro. Ele confirmou. “Houve participação minha nessa decisão”, disse ontem, e acrescentou que existe a possibilidade de o país sair do acordo do clima. O argumento é de que o compromisso fere a soberania nacional, e que o agronegócio está ‘sufocado’ por questões ambientais. (O futuro ministro de relações exteriores, nunca é demais lembrar, acredita que o aquecimento global é parte de uma conspiração “liberal” e “marxista”.)

Do lado de quem faz ciência, as conclusões são outras. O periódico Lancet acabou de lançar um estudo que relaciona a saúde com as mudanças climáticas. O Brasil é considerado um caso especial, por ser o país com a maior área da Amazônia. “A saúde da população brasileira está ligada à floresta Amazônica”, alertam os pesquisadores. A mensagem é clara: desmatamento reduz a expectativa de vida. De várias formas: pela razão óbvia de que o próprio desmatamento contribui para o aquecimento global, mas também porque há relação comprovada entre fogueiras feitas para desmatar, doenças respiratórias e internações hospitalares. Ou ainda porque “para cada quilômetro quarado de mata que derrubamos, há descobertas que deixamos de fazer”, como resume uma das cientistas. E também porque se a temperatura aumentar, um problema bem brasileiro – as doenças transmitidas por vetores como Aedes aegypti – podem piorar, como já está sendo verificado: entre 1950 e 2010, o mosquito aumentou sua capacidade de transmissão de doenças em 6%.

TERRA, DE NOVO

Ontem, Bolsonaro anunciou três nomes que integrarão o governo. E para a pasta que vai concentrar as políticas de esporte, cultura e programas como o Bolsa Família – batizada de Ministério da Cidadania – o nome indicado é velho conhecido de quem acompanha saúde: Osmar Terra (MDB). No início do ano, Terra conseguiu aprovar uma guinada na política voltada a usuários de drogas durante sua passagem pelo Conad, conselho ligado ao Ministério da Justiça. Guinada pró-internações e instituições religiosas, em detrimento das estruturas do SUS como CAPS.

ESSA TAL DESIGUALDADE

Na maior cidade do Brasil, dependendo do bairro onde você more, sua expectativa de vida pode ser 23 anos maior ou menor. Esse é um dos achados do Mapa da Desigualdade, divulgado ontem. O abismo social é mostrado a partir da vida de duas adolescentes nessa reportagem do El País. Kimberly, moradora da favela Paraisópolis, e Mariana, moradora de Perdizes. A primeira nunca botou os pés na Avenida Paulista e sonha em sair da comunidade, pois não conhece nenhuma jovem que lá tenha ficado e não tido seus planos interrompidos, geralmente pela gravidez precoce. Para a segunda esse tipo de preocupação não está no radar, a saúde é assegurada pelo plano do Hospital Albert Einstein e as férias foram em Paris…

MESMOS MÉDICOS

O Globo e Estadão abordam o mesmo problema: profissionais que já atuam no SUS contratados pelas prefeituras planejam deixar seus atuais postos para se candidatarem às vagas do Mais Médicos. A conclusão é simples: ao invés de mais médicos, teremos os mesmos médicos distribuídos de forma diferente. Vão desfalcar as vagas antigas, afetando também a Estratégia Saúde da Família. A tendência foi verificada em sete estados, onde mais da metade dos profissionais que preencheram as vagas do novo edital do programa já trabalhavam em unidades básicas de saúde.

Já a Folha mostra que, com a saída dos cubanos, a desorganização impera no interior do país: ambulâncias e carros das prefeituras são chamadas a todo momento para levar os moradores a unidades que tenham o profissional. Algumas pessoas simplesmente desistem de procurar o atendimento em outras cidades por conta própria, mesmo em casos graves, como o de suspeita de meningite.

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