Pages

Hoje na História: 1940 – Filósofo alemão Walter Benjamin comete suicídio

Do Opera Mundi, 27 de Setembro, 2018
Por Max Altman



Vítima da opressão humana, só teve seu trabalho reconhecido postumamente; Benjamin atém-se ainda ao contexto da luta de classes e da identificação clara do inimigo

Walter Benedix Schönflies Benjamin, ensaísta, crítico literário, tradutor, filósofo e sociólogo judeu-alemão, se suicida na pequena cidade catalã de Portbou, em 27 de setembro de 1940, morrendo aos 48 anos.
Combinando a teologia, a filosofia da linguagem e o marxismo, foi testemunha viva de uma época em pleno caos. O que é empurrou Benjamin a se suicidar por envenenamento de morfina na noite de 26 de setembro de 1940 na fronteira entre França e Espanha? Por que esse homem que amava tanto as palavras quanto as mulheres preferiu renunciar à vida?

Originário de uma família judia alemã, fez em Berlim e Munique estudos de Filosofia até o seu doutorado sobre o romantismo alemão. Sua tese foi mal acolhida e não lhe permitiram galgar um posto de professor na universidade.

Em 1914, quando eclode a Primeira Guerra Mundial, fica marcado pelo suicídio de diversos de seus amigos. Trava conhecimento com Gershom Scholem, que se tornaria especialista mundial da mística judaica e da cabala. Dos diálogos, Benjamin extrairia uma reflexão teológica que aplicaria à linguagem. Paralelamente se interessa pelo pensamento marxista, estimulado pelo seu encontro com a revolucionária ucraniana Asja Lacis.

Grande viajante, coleciona brinquedos, se envolve com o jogo e aprecia o haxixe. Admirador de Kafka e de Klee, percorre a Europa entre as duas guerras sem jamais parar de escrever, buscando em vão ser reconhecido, ser entendido. Malgrado as amizades com Bertold Brecht, Ernst Bloch e Hannah Arendt, mal conheceu a felicidade. Exilado e pobre, drogado e mal-amado, tentou diversas vezes se suicidar.

Quando Hitler assume o poder, seus amigos se refugiam no estrangeiro. Expulso da Alemanha se fixa em Paris, cidade de Baudelaire e Proust, autores que traduz e comenta habitualmente. Contudo, a França é ocupada. Seus amigos filósofos Adorno e Horkheimer conseguem-lhe um visto norte-americano. Tarde demais. Só lhe resta a fronteira espanhola para fugir. É preso. Aquele que sua mãe chamava de “senhor Desastrado”, não teve forças para suportar mais esta prova. Preferiu morrer a ser entregue à Gestapo.

Vítima da opressão, escolheu se matar, quando, após deixar a Paris ocupada, foi detido pelos guardas de fronteira espanhóis, que recusaram a sua entrada. Preferindo a morte à Gestapo, tomou pílulas no hotel em que o grupo de judeus que acompanhava aguardava a deportação.

A vida de Benjamin se constituiu numa série de mal-entendidos. Seria necessário vários anos após sua morte para que fosse reconhecido seu gênio e a modernidade da obra deste homem de múltiplos talentos.

Ao lado de uma abordagem sociológica, desenvolveu uma filosofia da linguagem que insiste nas funções “místicas”. O crítico ou o tradutor tem por vocação de “liberar a linguagem pura cativa nas obras”. A palavra é capaz de conduzir ao divino quando é expressa em sua natureza mais pura. Assim, a palavra do poeta ou do escritor designa as coisas em sua verdade. Sua teoria se inspira no romantismo de Goethe, de Hölderlin e na tradição judaica.

Benjamin explica que com o desenvolvimento de novas formas de arte como a fotografia e o cinema, a arte pode ser reproduzida ao infinito e perde desse modo seu caráter sagrado, sua “aura”. Em contraposição, a arte torna-se mais acessível e se abre a todos. Devido a esse progresso técnico, a arte torna-se propriedade das massas e confere ao espectador uma nova responsabilidade, a de julgar a título individual a autenticidade de uma obra.

As traduções e comentários de Benjamin acerca de Baudelaire, Proust, Green, Kraus ou Kafka, as passagens parisienses que se tornaram “teatro de todos os seus combates e todas as suas reflexões”, constituem ocasiões para aprofundar suas teses sobre a História. Ele considerava que o presente só se explicava com a ruptura com o passado. Por exemplo, à luz do surrealismo, a história é compreendida de maneira diferente. Isto se aplica em particular a sua época, que ele denuncia ser de opressão e violência.

Para Benjamin, a opressão não é exceção mas a regra, uma regra que se perpetua porque pode ser apresentada como um progresso histórico – o fascismo ao seu tempo ; a globalização ou o terrorismo, nos dias de hoje. “Aqueles que não querem ver que certas coisas sejam ainda possíveis no século 20” não trilham o caminho do conhecimento. Seu espanto nada tem de filosófico, não constitui o início do conhecimento, a menos que se deem conta que a visão da história que torna possível o objeto de seu espanto – fome, guerra, etc. – seja insuportável.

Benjamin atém-se ainda ao contexto da luta de classes e da identificação clara do inimigo. Atualmente, é mais difícil identificar claramente o fascismo, porém o pensamento de Benjamin encontra sempre aplicação: o terrorismo é condenável mas ele se abriga sob o manto da libertação da opressão e da contestação ao imperialismo. A globalização é justamente condenada pelos altermundialistas, no entanto ela carrega em si uma esperança de redenção da humanidade sofredora.

Nenhum comentário:

Postar um comentário