Do IHU, 15 de Setembro, 2016
Por Cimi
Tinha muita fumaça, tava difícil de ver… atrás dela os pistoleiros começaram a atirar. Acho que não queriam matar não, mas não deixaram a gente apagar o fogo”, conta Gilmar Guarani e Kaiowá ao contabilizar sete casas destruídas pelas chamas e cerca de 40 indígenas que nesta terça-feira, 13, choram por tudo o que perderam.
Estão desabrigados na própria terra, o tekoha - lugar onde se é - Kurusu Ambá, emCoronel Sapucaia (MS), fronteira do Brasil com o Paraguai. O incêndio correu pela terra indígena e durante a madrugada consumiu as casas. Crianças, mulheres, anciãos: famílias inteiras tiveram que fugir; do fogo e dos tiros. “Tô dizendo pra eles não chorar. Vamos refazer tudo”, diz Gilmar.
Este é o quinto ataque em 2016 contra acampamentos do povo em Kurusu Ambá. Em janeiro, um outro acampamento também foi incendiado por pistoleiros - na ocasião, porém, o fogo foi ateado pelos próprios pistoleiros nos barracos e pertences indígenas (na foto). O último ataque antes desta terça ocorreu em 12 de julho: pistoleiros cercaram um outro acampamento e atiraram contra os indígenas.
Ataque à aldeia em janeiro de 2016 (Foto: Cimi)
Não se sabe como este último incêndio começou. “Pistoleiros tavam lá, né. Atrás da fumaça, pow pow. Correu tudo a gente. Deus protegeu e ninguém se feriu. Perdeu tudo só. Não sobrou nada: cobertas, roupas. Tão sem nada, só roupa do corpo. Triste. Por isso a gente pede demarcação. Só assim pra fazendeiro respeitar”, afirma Gilmar. A Fundação Nacional do Índio (Funai) foi informada sobre o novo incêndio e ataque.
O Guarani e Kaiowá explica que as casas incendiadas estavam na retomada daFazenda Bom Retiro, mas o fogo veio de uma parte não ocupada pelos indígenas daFazenda Barra Bonita, onde desde março deste ano há um acampamento do povo em outro pedaço da fazenda. Outras duas fazendas, a Madama e Santa Joana, também com áreas retomadas pelos indígenas, estavam no perímetro do incêndio.
Kurusu Ambá está em processo de identificação e delimitação há uma década. O relatório deveria ter sido publicado pela Funai em 2010, segundo Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) estabelecido pelo Ministério Público Federal (MPF), em 2007. No entanto, o relatório foi entregue pelo Grupo Técnico (GT) somente em dezembro de 2012, e ainda aguarda aprovação da Funai de Brasília.
Histórico de ataques
Em março, horas depois da Relatora Especial da Organização das Nações Unidas (ONU) para os Direitos e as Liberdades Fundamentais dos Povos Indígenas, Victoria Tauli-Corpuz, ter visitado o acampamento, pistoleiros a cavalo e em caminhonetes atacaram a comunidade a tiros. O ataque se repetiu, dois dias depois.
Em janeiro, os Kaiowa de Kurusu Amba foram atacados a tiros e um acampamento inteiro foi incendiado pelos pistoleiros.
Em junho de 2015, os indígenas haviam tentado ocupar a mesma fazenda, sendo violentamente expulsos pelos fazendeiros. O saldo do ataque foi de duas crianças desaparecidas, casas incendiadas e dezenas de feridos.
Em 2007, ano em que os Kaiowá iniciaram a retomada de Kurusu Ambá, duas lideranças foram assassinadas - uma delas, na mesma fazenda Madama. Entre 2009 e 2015, mais dois indígenas foram mortos em Kurusu, no contexto da luta pela demarcação de seus territórios tradicionais.
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