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Venda do arquivo pessoal de García Márquez aos EUA gera incômodo na Colômbia


Família afirma que governo colombiano não demonstrou interesse no acervo. Foto: Reprodução.
 A notícia da venda do arquivo de vida e obra de um dos escritores colombianos mais prestigiados do mundo à Universidade do Texas (Estados Unidos) surpreendeu os colombianos e colombianas. O acervo abarca meio século de produção e consta de quase 2 mil cartas trocadas entre Gabriel García Márquez e outros grandes literatos contemporâneos, um livro inconcluso, vasto material relativo aos seus romances, dentre diversos objetos pessoais serão agora propriedade do Centro Acadêmico Harry Ransom, em um país que negou ingresso ao escritor durante muitos anos por conta de sua amizade com o líder revolucionário cubano Fidel Castro.

Da página Adital, 02, dezembro de 2014
Por Marcela Belchior

O desconforto no país natal de García Márquez ganhou repercussão internacional depois que um dos filhos do escritor, Gonzalo García Barcha, disse à imprensa local que o governo colombiano não havia demonstrado interesse no material. Procurada pela imprensa, a ministra da Cultura, Mariana Garcés, desmentiu a versão do herdeiro.

Garcés afirmou que o governo ofereceu à Mercedes Barcha, viúva do autor, comprar não somente os arquivos, mas todo o legado do escritor. No entanto, não chegou a fazer uma oferta formal. Segundo ela, não houve iniciativa de adquirir os arquivos de García Márquez por se tratar de uma decisão da família do escritor e que são "absolutamente respeitosos ao que se decida diante dessa coleção”.

"Manifestamos nosso interesse, mas não chegamos a fazer uma proposta formal. Evidentemente, esses são arquivos que têm custos enormes e se eles nos houvessem reiterado sua intenção de vendê-lo, seria preciso discutir em termos orçamentário e financeiro”, disse Garcés à imprensa. "Nós, certamente, teríamos feito um esforço para adquirir esses materiais, mas também é necessário dizer que a Universidade do Texas tem um dos maiores arquivos literários do mundo. Eu suponho que a família considerou que ali seria garantida sua conservação e, sobretudo, seu uso público e acadêmico”, complementou a ministra.

Segundo Mariana Garcés, a oferta à família de Gabriel García Márquez foi feita por meio da diretora da Biblioteca Nacional da Colômbia, Consuelo Gaitán, que reiterou que a decisão partiu da família do escritor, com a intenção de que o acervo fosse destinado ao âmbito acadêmico. "Não conseguimos fazer nenhuma oferta porque eles haviam decidido que fosse para os Estados Unidos, incluindo arquivos acadêmicos universitários”, reforçou Gaitán à imprensa. O filho mais velho do literato, Rodrigo García Barcha, inclusive, vive nos EUA. "Não entendo porque tanto escândalo. (...) Fazem uma tempestade num copo d'água”, criticou a diretora. 



Constam na coleção livros, manuscritos, máquinas datilográficas, computadores e fotografias. Foto: Universidade do Texas.

Qual é o acervo?

A coleção inclui os manuscritos originais de 10 romances de García Márquez, entre eles sua obra-prima, "Cem anos de solidão” (1967), além de "O amor nos tempos de cólera” (1985) e "Memórias de minhas putas tristes” (2004), a maioria no idioma castelhano; duas máquinas datilográficas da marca Smith Corona e cinco microcomputadores da marca Apple.

Além disso, constam no acervo que será enviado aos EUA mais de 40 álbuns de fotografias, que documentam vários momentos de sua vida por quase 90 anos, documentos do Prêmio Nobel de Literatura (que o autor recebeu em 1982), uma cópia de seu romance inconcluso intitulado "Em agosto nos vemos” e cerca de 2 mil cartas que García Márquez trocou com intelectuais, como Graham Greene, Milan Kundera, Julio Cortázar, Gunter Grass e Carlos Fuentes, além de correspondências com o ex-presidente cubano Fidel Castro.

Integram ainda o acervo álbuns com recortes de jornais da América Latina e outras partes do mundo que compilam sua carreira. O arquivo de García Márquez será conservado no Centro Harry Ransom ao lado do trabalho de escritores como o argentino Jorge Luis Borges, os estadunidenses Ernest Hemingway e William Faulkner e os irlandeses Samuel Beckett e James Joyce.

De acordo com a Universidade do Texas, futuramente, parte do arquivo de "Gabo”, assim como de outros autores que constituem o acervo da instituição será digitalizado com o propósito de facilitar o acesso ao público. Brevemente, também deve ser realizado um simpósio universitário para discutir o legado a vida e obra do autor colombiano.


Manuscrito da obra-prima "Cem anos de solidão”. Foto: Universidade do Texas.


Notas originais do autor. Foto: Universidade do Texas.
 
Na Biblioteca Nacional da Colômbia, ficarão cerca de 400 cópias das obras literárias de García Marquez, uma doação da família. É possível que a medalha que ele recebeu pelo Prêmio Nobel e a máquina datilográfica na qual escreveu "Cem anos de solidão” também sejam abrigadas na instituição. A Biblioteca também deverá criar uma reprodução do escritório pessoal do autor.

O escritor e jornalista colombiano Gabriel García Márquez morreu em 17 de abril de 2014, aos 87 anos de idade. Ganhou notoriedade internacional por suas obras literárias e sua militância política de esquerda. Nos anos 1990, o então presidente dos EUA, Bill Clinton, vetou a entrada de García Marquez no território estadunidense, recebendo-o na Casa Branca tempos depois.


 
 

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